Torá em Português
Parashat Vaierá
Miragens da Justiça
Tradução de español: David Abreu
Esta semana, lemos na Torá sobre a destruição de Sedom e Amor (Sodoma e Gomorra).
Ao falar dessas cidades, tendemos a pensar que nesses lugares a justiça estava ausente. E não é verdade. Eram cidades com muitas leis, e o povo não dava as costas às SUAS LEIS.
Então, o que deixou D’us tão zangado? Por que destruir duas cidades com pessoas tão obedientes?
Dizem-nos, por exemplo, que havia uma lei em Sedom que proibia dar pão aos pobres. Quem desse pão aos pobres seria queimado no fogo. Quando um homem pobre se aproximava deles, eles não lhe davam pão, mas apenas moedas , e cada um escrevia seus nomes nelas. Quando o pobre morria, cada um vinha e recolhia sua moeda de volta.
Sedom era um lugar muito "civilizado", mas faltava o temor a D’us. E sem temor a D’us, as leis faziam pouco sentido.
Quando leio a história de Sedom e Amor, me vem à mente o que várias gerações depois aconteceria na terra do Egito.
A Torá nos diz que quando os filhos de Israel desceram ao Egito, o Faraó do Egito os colocou na terra de Goshen, nos subúrbios do império.
Por que os hebreus foram habitar naquele lugar tão remoto?
A Torá nos diz: Ki Toavat Mitzraim Kol Roé Tzon (Bereshit 46, 34).
Pastores de ovelhas eram uma abominação para os egípcios.
Abraham Ibn Ezra explica que os egípcios eram vegetarianos naquela época e não permitiriam que um homem comesse carne em seu ambiente de forma alguma.
Os filhos de Israel eram apreciados no Egito, sua ocupação nem tanto.
Para os egípcios, era abominável um homem brincar com a vida de um animal.
Algumas décadas depois, os mesmos egípcios que tanto amavam os animais estavam jogando crianças hebreias no Nilo.
Isso não era abominável.
Quando eu estava lendo este comentário de Ibn Ezra, a imagem do nazismo me veio à mente.
Um dos maiores paradoxos da história é que o regime nazista foi um dos precursores das políticas estatais em favor da ecologia e do meio ambiente.
Em 1933, o nazismo aprovou a Lei de Proteção aos Animais. Um ano depois, a Lei de Caça do Reich foi aprovada e em 1935 a Lei de Proteção à Natureza entrou em vigor.
O mundo ainda não sabia que deveria aprovar uma Lei de Proteção contra o Nazismo, ignorando que esse regime tão propenso ao amor à natureza protagonizaria o capítulo mais desastroso da história da humanidade.
Ferir a natureza era abominável, as câmaras de gás não.
O Rabino Yissocher Frand explica essa ideia por meio de um exemplo muito gráfico.
O respeito às leis nem sempre garantem a harmonia social.
No meio da Noite dos Cristais na Alemanha nazista, um menino correu para a escola e gritou para informar ao Rabino que sua casa estava pegando fogo.
O Rabino saiu correndo da sala de aula e ligou para o Corpo de Bombeiros para relatar o incêndio.
"Não podemos fazer nada", disse o chefe dos bombeiros. "Apagar ESSE incêndio é ilegal."
A Alemanha continuava sendo um país de leis, como sempre. Aconteceu que naquela época era ILEGAL apagar incêndios em casas judias.
Desse ponto de vista, na Alemanha de Hitler aconteceu o mesmo que em Sedom: as pessoas respeitaram as leis ao pé da letra, mas sem temor a D’us, as leis são inúteis.
Talvez seja por isso que D’us diz a Abraão após as dez provas a que foi submetido (Bereshit 22, 12): "Agora eu sei que você é temente a D'us."
Por que D’us escolheu essa expressão?
Por que não dizer a ele: 'Agora eu sei que você é obediente' ou 'Agora eu conheço a sua submissão'?
Possivelmente, porque existem muitas pessoas obedientes e submissas no mundo, mas elas obedecem e se submetem a essas miragens de justiça.
Existem muitas pessoas obedientes e submissas no mundo, mas elas obedecem e se submetem a essas ilusões sobre justiça.
O povo de Sedom era obediente, o povo do Egito insultava os pastores, o povo de Hitler era submisso.
Mas Abraão era diferente. Abraão foi o primeiro a temer o Céu.